Política
Em protesto às operações em universidades federais, placa antifascista é instalada na UnB
UnB não foi notificada, mas segue atenta ao que ocorre nas universidades federais

Por ANNA BEATRIZ VIEIRA, DENISE SIMINO, KARINA AMARAL e VITÓRIA RUSSEL

Desde a última terça-feira (23/10), universidades federais de sete estados foram alvo de operações da Justiça Eleitoral contra suposta propaganda política irregular. Mesmo sem ser notificada, estudantes e funcionários da Universidade de Brasília organizaram manifestações, e membros da Reitoria seguem “atentos ao que vem ocorrendo nas universidades”. Na noite desta sexta-feira (26), uma placa com os dizeres “UnB Antifascista” foi instalada no prédio da Faculdade de Direito (FD)

As ações começaram no Rio de Janeiro, com a retirada da faixa “Direito UFF Antifascista” do prédio de Direito da Universidade Federal Fluminense. Ainda no Rio, dessa vez na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, policiais militares tentaram remover as faixas em homenagem a vereadora Marielle Franco, do PSOL, assassinada em março, e placas com os dizeres “Direito Uerj Antifascista”. Em solidariedade uma placa com os dizeres “UnB Antifascista” foi instalada na Faculdade de Direito. Alunos se organizaram para protestar.

O cientista político e professor UFF Marcus Ianoni disse ao Campus Online que “casos como os que estão acontecendo têm servido para aumentar o medo”. “A retirada das faixas pela Polícia Federal está sendo totalmente arbitrária, já que os dizeres não estão relacionados diretamente a nenhum candidato. As faixas falam sobre o antifascismo, são apenas uma demonstração de liberdade de expressão sobre um assunto defendido pela constituição. Faixas que falavam sobre a morte da vereadora do Rio de Janeiro Mariele Franco também foram retiradas sem justificativa plausível”, apontou.

No Rio Grande do Sul, o evento “Contra o Fascismo, Pela Democracia” foi impedido de ser realizado. A alegação foi a de que havia ato eleitoral dentro de uma instituição pública, o que é proibido de acordo com a lei 9.504/1997. Na Paraíba, foram três ações e uma delas com busca e apreensão. Os policiais federais estiveram na sede da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Campina Grande e recolheram panfletos denominados “Manifesto em defesa da democracia e da universidade pública” e um suposto material pró-Fernando Haddad, candidato do PT. A associação diz que se tratava de um manifesto em favor da democracia e não de partido político.

Na Universidade Estadual da Paraíba, fiscais do Tribunal Regional Eleiroal (TRE) fiscalizaram, dentro das salas de aula, a possibilidade de haver propaganda política. A aula pública “Esmagar o Fascismo” foi suspensa por um mandado do TRE. No Pará, PMs armados invadiram uma sala e ameaçaram o professor de prisão ontem (25/10) quando averiguaram o teor ideológico da aula. As ações provocaram reações imediatas por parte de universidades, professores, centros acadêmicos e estudantes. A União Nacional dos Estudantes se posicionou e disse, em uma rede social, que “ações arbitrárias constituem um claro precedente contra a autonomia universitária, a pluralidade de pensamento, o respeito às tradições das ciências sociais e o cerceamento à liberdade de pensamento”.

UnB em atenção

Na Universidade de Brasília, nenhuma ação policial foi realizada. Ao Campus Online, o chefe de Gabinete da reitoria, o professor Paulo Cesar Marques da Silva, afirmou:

“Nós estamos atentos ao que vem ocorrendo nas universidades, mas não tivemos qualquer notificação ou coisa semelhante na UnB”

O Diretório Central de Estudantes (DCE) da UnB reforçou pelo Facebook que ‘’a gestão atual reforça seu compromisso em garantir o espaço plural, democrático e tolerante para a contraposição de ideias ocorrer de forma decorosa, resguardando o direito do contraditório e a voz de cada indivíduo que representamos’’.

A estudante de fonoaudiologia Andreza Marques diz que se sente ameaçada pelas falas do candidato Jair Bolsonaro, do PSL. “Me sinto muito ameaçada no momento em que percebo o meu lugar na luta de classes. Visto que estou no ensino superior público e sou mantida por auxílio socioeconômico, as falas privatistas do candidato Bolsonaro mostram que ele não se compromete com nada do guarda-chuva da proteção social, que eu e muitos brasileiros que necessitam do apoio do Estado poderemos ficar a mercê do mundo e dos sub-empregos”, desabafou.

O estudante de ciência da computação Rodrigo Cardoso diz temer não só por ele, mas por todos os estudantes. “Haverá ainda mais sucateamento da universidade e as ameaças racistas, já concretizadas, com certeza tenderão a se intensificar”, opinou.

Repúdio

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se posicionou contrária às ações e afirmou que “as Universidades devem ser respeitadas como espaço autônomo de promoção de debates e discussões, assegurando o direito de todos os integrantes da comunidade acadêmica- sejam de direita ou esquerda- de exporem seus posicionamentos, sempre dentro dos limites da lei. A OBA condena toda forma de censura e de violência política”.

A Procuradoria Geral da República (PGR) vai entrar com um recurso no STF para que a normalidade no ambiente universitário seja restabelecido. Raquel Dodge vê indícios de ofensa à liberdade de expressão, liberdade de reunião e à autonomia universitária. A presidente do TSE, Rosa Weber, disse, em sessão desta sexta, que a Corregedoria vai analisar e adotar as providências cabíveis para esclarecer circunstâncias e coibir eventuais excessos sobre ações nas universidades contra manifestações políticas.

Até a publicação desta reportagem, dois ministros do STF - Gilmar Mendes e Marco Aurélio Melo - posicionaram-se sobre a operação. Gilmar Mendes disse que é preciso “cautela” com esse tipo de ação. “Em geral, (as universidades) têm uma ebulição que é positiva, que não necessariamente estão afeitos ao período eleitoral”, sustentou o ministro.

Marco Aurélio afirmou que a “universidade é campo do saber. O saber pressupõe liberdade, liberdade no pensar, liberdade de expressar ideias. Interferência externa é, de regra, indevida. Vinga a autonomia universitária. Toda interferência é, de início, incabível. Essa é a óptica a ser observada. Falo de uma forma geral. Não me pronuncio especificamente sobre a atuação da Justiça Eleitoral. Mas reconheço que a quadra é de extremos. Por isso é perigosa, em termos de Estado Democrático de Direito.”

Foto: Luiza Coe, para Campus Online

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